Divertidamente 2: O evento 13 anos nunca foi tão bem representado
Divertidamente 2/ Inside Out 2
Comédia, Drama, Aventura, Família, Fantasia, Animação
Direção: Pete Docter, Kelsey Mann
Roteiro: Meg LeFauve
Elenco: Amy Poehler, Phyllis Smith, Lewis Black, Tony Hale, Ayo Edebiri, Maya Hawke
Começo logo dizendo que além de Carros, Divertidamente é o único filme da Disney que se estiver passando, eu não paro pra assistir. Algumas coisas funcionaram, mas a maioria dos desenvolvimentos sobre as "lições de vida" ficaram insatisfatórias pra mim.
Logicamente, não esperava muito dessa sequência e fui surpreendida muito positivamente.
Vi algumas pessoas reclamando de falta de plot twists surpreendentes e sentimentos tratados de forma um pouco rasa e simplista. Ironicamente são pessoas que amaram o primeiro filme, onde esses pontos são reais e um pouco problemáticos sim, já que era parte do marketing dizer que se tratava de um estudo da mente de uma criança (fazendo parecer que seria tudo extremamente detalhado e pesquisado). O que, se a gente parar pra pensar, não é só pretensioso como descabido.
Se não pela gama extensa de emoções contidas na mente humana, e principalmente por cada ser humano ser único.
O bom do volume 2 é justamente o quanto roteiro e direção tem uma perspectiva mais realista de alcance real da psicologia envolvida.
Passamos de "e vamos de doutorado em psicologia infantil, olha como te ajudamos a entender a cabeça da sua criança/pré adolescente" para
"talvez, só talvez, uma ida em um psicólogo sem grandes pretensões de mudar sua vida seja tudo que você e seus filhos precisem agora".
O primeiro ponto que me chamou a atenção positivamente em relação às diferenças com o antecessor, era que muitas vezes as coisas aconteciam na mente, mas a gente não via como ela estava por fora, o que acontecia, o que as decisões das emoções faziam na Riley e aqui é quase uma sequência do lado de fora, corta pras emoções, vai de novo pra mostrar o que acarretou (por exemplo, o Raiva meter o mãozão no controle) e aí por diante. Isso já deu um dinamismo e realismo que não senti em tamanha dimensão no filme anterior.
Nessa sequência, vimos uma Alegria que parece, assim como Riley, mais madura e comedida, reconhecendo Tristeza e os outros sentimentos como iguais e não subalternos, porém não demora muito pra gente perceber que esse é só um reflexo de mais uma auto percepção equivocada das várias que a própria Riley tem de si.
Quando Ansiedade, Inveja, Vergonha (o discretíssimo crush da Tristeza nele é hilário) e Tédio se apresentam, por mais que Alegria se esforce, não consegue manter o controle muito tempo, e, pensando que está fazendo o melhor pela menina e seu futuro, a Ansiedade toma conta do recinto e há quem pense que isso a transforma na vilã.
Ansiedade com seu pequeno painel de possibilidades e tocando o terror psicológico foi uma ótima maneira de representar o que causa as crises e como começa a auto sabotagem que ela faz
Não, somente reflete o descontrole emocional que uma menina tem ao se ver em situações nas quais, na visão dela, se ela não se transformar em outra pessoa, vai ser deixada pra trás, o que leva a decisões cada vez menos pensadas, que acarretam mais domínio da Ansiedade e culminam em uma crise bem severa. Ou seja, uma terça-feira normal de qualquer adolescente (e adultos, e até crianças).
Vergonha e Ansiedade estão sempre perto um do outro (o que significa - somente pela minha própria interpretação - que muitas vezes quem tem ansiedade não está agindo como ela mesma, se envergonha disso, mas não tem controle sobre si a ponto de acabar com a crise) assim como Inveja (talvez um pequeno ressentimento de todo mundo ao redor que o ansioso julga ser mais controlado que ele), que é de uma fofura desconcertante.
Tédio já fica afastada e só se manifesta com destaque duas vezes, o que também faz sentido com a movimentação e estado de alerta constante que uma crise de ansiedade causa.
Uma boa maneira de ver a Ansiedade como além da coisa que só atrapalha é lembrar que, controlada, é ela quem impulsiona Riley a tomar decisões e atitudes que a tiram de problemas causados pela Alegria fora de lugar e outras emoções desregradas. Só quando ela vai tomando proporções que não lhe cabem é que começa a dar problemas e aí sim, é uma crise, é algo que não deveria acontecer.
Um toque da Ansiedade ajuda, um abraço atrapalha.
A meu ver, essa jornada da Riley, apesar de ser bem parecida com a do primeiro filme, é mais bem estruturada, com muitas obviedades sim (a árvore das certezas, a mais gritante) mas com desdobramentos que exploram muito bem essas lições simples e básicas. Dizer que tudo ali se limita a um grande "seja você mesmo, vai ficar tudo bem" diz mais sobre a limitação do público que do longa.
Claro que há falhas também. A própria Inveja poderia ser melhor explorada, se transformando aos poucos em um imenso monstro devorador e assustando as outras emoções (como a inveja começa como admiração, cobiça, competição e vai escalonando pra desejo de posse e destruição do objeto de inveja) e talvez essa tenha sido uma das ideias iniciais, mas depois decidiram focar na ansiedade, e provavelmente foi melhor assim. Não queremos assustar as crianças.
Vi algumas opiniões apontando falta de originalidade, mas não seria muito razoável esperar uma coisa totalmente inovadora de uma sequência, e no que significa e justifica uma continuação, Divertidamente 2 faz um trabalho muito bom, com personagens novos em funções claras e necessárias (sim, presentes desde a tenra infância, e essa foi uma falha que apontei no primeiro filme, mas curiosamente decidiram ignorar o quão simplista era limitar as emoções da infância a 5, pra agora, convenientemente isso ser apontado) e com lições óbvias e quase saídas de um livro iniciante de auto-ajuda (sim como o primeiro também, e de novo, magicamente só notaram e se incomodaram agora) mas não por isso são menos necessárias e definitivamente não são tratadas de forma banal.
Divertidamente 2 é uma conversa sem grandes aprofundamentos, mas acolhedora e reconfortante, sobre crescimento, auto cobrança, auto percepção mais realista em detrimento de se ver como uma pessoa perfeita, e uma auto confiança saudável. Sobre amizade, vida e um pouco também sobre saúde mental. Tudo isso embalado na forma brilhante e colorida própria da Pixar-Disney.
Acredito que seja difícil não gostar de nada desse segundo filme, principalmente pra quem é fã do primeiro. O nível deste pode não se equiparar a ele para os admiradores mais ferrenhos do original, porém acredito que agrade sim. É sensível, inteligente, bem desenvolvido e com ritmo ágil, é um tanto difícil ver como poderia não funcionar, principalmente como entretenimento.
Raras vezes uma sequência me agrada, menos ainda quando nem do primeiro eu gosto, e que ela se torne uma ótima surpresa, é mais raro ainda. Felizmente foi esse o caso.
No aguardo de Divertidamente 3 com Riley no ensino médio ou entrando na faculdade.
Comentários
Postar um comentário