The Harder They Fall/Vingança e Castigo: Nada dói mais do que o golpe do espelho.

 



Diretor: Jeymes Samuel
Elenco: Idris Elba, Zazie Beetz, Regina King, Jonathan Majors, LaKeith Stanfield, RJ Cyler, Delroy Lindo, Danielle Deadwyler, Edi Gathegi
Roteiro: Jeymes Samuel; Boaz Yakin 
Produtores: Lawrence Bender, Shawn Carter, James Lassiter, Jay-Z (que compôs músicas com o diretor, que também é compositor e músico para o filme), Jeymes Samuel.






Alguns dias atrás estreou na Netflix "The Harder They Fall"/"Vingança e Castigo" drama de faroste que é a estreia de Jeymes Samuel na direção de longa-metragem. Uma grande homenagem ao gênero, tanto o clássico quanto o "cafona" mais conhecido como spaghetti western.

Jeymes é um compositor e produtor renomado no meio do rap e hip-hop, na verdade, na música como um todo. Já dirigiu curtas e é muito bem relacionado, um exemplo disso é sua parceria de composições com Jay-Z, que participa da produção, e também da trilha sonora, tanto com músicas próprias dele, quanto com outros títulos de ritmos que variam entre rap, hip-hop, reggae e spirituals (spirituals‎ são ‎‎canções‎‎ folclóricas tradicionais que se originaram em comunidades escravas afro-americanas durante o século XIX. Quando os escravos africanos foram trazidos para os Estados Unidos e cristianizados, eles começaram a perceber paralelos bíblicos com sua própria situação — e às vezes eram até encorajados a fazê-lo por brancos zelosamente evangélicos  ).

Eu poderia definir a direção de Samuel como gingada. É um filme com tanto entusiasmo e ritmo, que lembra um funky do James Brown, daqueles que é impossível ouvir e ficar parado. Você é sugado para dentro daquela estória logo no começo, com uma cena impactante. Contudo, talvez por esse impacto inicial, o espectador fique um pouco incomodado com a falta de profundidade e exploração dos personagens por um certo tempo, eles demoram a se abrirem para a audiência, porém, no meu caso, isso não chegou a me tirar o foco dos acontecimentos iniciais, que eu estava aguardando de olhos pregados na tela para saber a explicação. 

Em tempo: É dito, antes do filme começar, logo após o tudum da Netflix, que esse filme é uma ficção, mas que as pessoas nele, realmente existiram. Ou seja, Nat Love, Rufus Buck e todos os outros existiram sim, porém, nem na mesma época eles viveram. Nat Love, por exemplo, é uma figura histórica conhecida por ser um cowboy dos mais competentes (e tem o fato de não existirem muitos cowboys negros). Mas ele não tinha nada de fora-da-lei. Caso queira saber as reais histórias, esse artigo do Screen Rant é bem esclarecedor (se não fala inglês, é só clicar com o botão esquerdo do mouse e ir em "traduzir para o português").

Já apontei o que me causou um leve desconforto, o único real defeito na produção, então agora, vamos falar de coisa boa? Vamos falar de TekPix (Pronto, denunciei a idade).

Passado o primeiro ato um pouco devagar, e até desigual, pois tem alguns momentos impetuosos ali no meio do vai-não-vai, quando decide engatar, engata e vai acelerando até dar de cara com um muro emocional brabo de passados sofridos e histórias, que infelizmente são tão dolorosas quanto reais e atuais. No entanto, até chegar lá, no cerne do drama, você ri algumas vezes, fica bem tenso em muitas outras, e se deleita com os enquadramentos, a fotografia quente na maior parte das cenas, os diálogos e a trilha sonora.  
 
Poderia começar falando das atuações que vão de competentes a brilhantes. 
Do figurino que foi muito bem feito, as roupas, tanto nos homens quanto nas mulheres ficaram tão naturais que parecia que eles se vestiam daquele jeito desde sempre. 
Poderia falar de como os cenários também foram convincentes, a ponto de me perguntar, porque não se tem tamanho esmero com outros filmes, não só desse gênero, mas de outros. 
Mas vou, com todo o respeito, me estender um pouco mais é sobre o texto, o roteiro. 

O que tem demais nesse roteiro? 
Como alguém que trabalha (mesmo que não de forma remunerada) com palavras, tenho (na verdade, sempre tive, desde criança) grande apreço por textos bem escritos e com alma, textos com um certo toma um pedaço de mim aí. O diretor sabe sim, passar seu recado na forma como dirige, é bem hábil nisso, mas é no roteiro que ele, de fato, fala. Parece redundante, mas não é. 

Quantas vezes vemos um filme em que um personagem berra, chora, rasga as roupas, e mesmo assim, não importa quantos diálogos expositivos tenha, você ainda assim não entende porque aquilo é dramático. Não é insensibilidade sua. É artificialidade do roteiro. Aqui, não há uma só gota (ou melhor, letra) artificial. Mas você disse que demora a engatar a entrega dos personagens. Sim, isso é real, mas isso pode ser chamado superficialidade, e, bem, às vezes uma pessoa demora um pouco pra te deixar passar do ponto superficial com ela, certo? Você não conhece ninguém num dia. Caso demorasse um pouco mais, ou não passasse mesmo da primeira camada, aí sim, eu apoiaria quem o maldiga e faria eco, inclusive. 

As críticas negativas não se sustentam, pois, como disse antes, o primeiro longa-metragem de Samuel tem ritmo, carisma e diz completamente, tanto mostrando quanto falando, a que veio. 

Nenhum dos personagens teve uma vida fácil. Todos sabem bem manejar armas e lutar porque, em suas estradas, o importante era sobreviver e ser machucado o menos possível. Se o jeito para isso era roubando, espancando e matando, bem, antes estivessem do lado que batia, porque se percebe que todo mundo ali apanhou muito. E quando a gente apanha, a gente aprende a bater.

O fato do bando de Nat Love roubar de ladrões quer dizer que ele não se importa de correr perigos, e são muito perspicazes no que fazem, pois, uma falha pode levá-los à morte. E isso já nos conta bastante do personagem, e de quem anda com ele. A lealdade a um bando que pode estar morto uma hora mais tarde é de gente que prefere viver correndo um risco absurdo, pois já viveu de forma bem pior antes, e aí você pensa: o que essas pessoas passaram para eles julgarem que essa vida seja melhor?

Pela cena do banco, onde eles impõem o respeito sem disparar uma só vez, eu poderia dizer que, pela satisfação, que até eu senti, que o que eles passaram muitas vezes foi opressão, humilhação e sentimento de não fazer realmente parte do meio em que viviam. Isso tudo foi, em conjunto com os traumas de cada um, os levando a um estado de sobrevivência do mais forte no seu entendimento mais puro e cruel. 

Essas conclusões são tão somente minhas. Não vi ninguém, envolvido no filme ou não, falando disso em lugar nenhum, portanto, tal percepção pode estar equivocada. Ou seja, é só o que eu penso mesmo, nada mais. 


As atuações

Uma das coisas que mais gerou expectativa desde que a produção foi anunciada, e os nomes do elenco, declarados (houveram algumas mudanças, graças à pandemia, Cynthia Erivo, Wesley Snipes and Sterling K. Brown, escalados de início, tiveram que dar adeus às filmagens) foi saber se somente esses atores respeitáveis já seriam motivo suficiente para atraírem o público. 

Se direção e roteiro não fossem bons, o elenco dificilmente faria algo que prestasse. Porém, como tudo andou corretamente, os astros se destacaram com primazia. 

Idris Elba é coeso e sensível como poucos, na maioria das vezes se sobressai em apenas uma aparição, e quase não necessita de falas para impressionar. Aqui, interpretando o impiedoso fora-da-lei Rufus Buck, não é diferente. 

Jonathan Mayors já me arrancou aplausos eufóricos em LoKi. Magnífico! Como Nat Love, que vive em função de seu trauma e busca por vingança (poderia fazer um paralelo com um herói, mas certamente alguém reclamaria de spoiler), me fez pensar por alguns minutos, se eu veria aquele esplendor da série da Marvel novamente, mas quando ele finalmente sai da toca, não tem retorno. Sua atuação é arrebatadora. 

LaKeith Stanfield, está bárbaro. Nada que esse rapaz faz fica ruim, e isso é impressionante. Quando ele se apresenta no trem como Cherokee Bill e, trata tudo o que o bando faz naquela informalidade formal, sabe?! Então, vamos resolver umas coisas aqui, mas não é nada pessoal, tá? Chega a ser engraçado. Ele aparenta (só aparenta) mais docilidade e paciência do que é esperado até da mulher presente no meio dos bandidos. 

Regina King com seu talento absurdo fazendo a Treacherous Trudy (Trudy Traiçoeira), não demonstra um pingo de sentimento, remorso ou consideração nem com companheiros do próprio grupo. Se tem um membro que ultrapassa Rufus em impiedade e frieza é ela. 
   

                                                              Regina, pode me espancar, eu deixo.

                                                    
                                                Pode atirar em mim também, sem problemas

Zazie Beetz também está competente como Stagecoach Mary, interesse amoroso de Nat Love. Zazie é imponente, sua presença é sempre marcante, e a atriz sabe aproveitar a vantagem que sua figura proporciona.

Danielle Deadwyler, como Cuffee está um primor. A personagem dela, me atrevo a deduzir, foi a mais arriscada e cujo desafio de interpretação foi maior. A destreza da atriz foi gigante para não deixar que seu desempenho ficasse piegas ou descambasse para o patético. 

RJ Cyler, Edi Gathegi e Delroy Lindo completam o time dos sonhos, campeão e avassalador. Todos os três são relevantes, tem bons momentos e não decepcionam.

Em suma: Se você está procurando um filme bem dirigido, emocionante, com uma boa estória e atuações mais do que eficazes, claro que recomendo "Vingança e Castigo"/"The Harder They Fall".
                                                                                                                          
                                                                                                                             Nota: 8.5



Como disse antes, meu trabalho no blog não é remunerado, então 
Se gostou da crítica, ajude o blog a continuar. 
Faça um "pix" de qualquer quantia para 5dea5a9c-0774-4c7f-a956-1cddc109470b






 

Comentários

Postagens mais visitadas