Pig: A prova que o problema de ser pretensioso é quando falta competência e sensibilidade em doses iguais.

                                        

Quando se fala em Nicholas Cage é praticamente certo que venha em seguida alguma piada, meme ou comentário ridicularizando suas atuações espalhafatosas e sua personalidade peculiar, mas nem sempre foi assim.

Nicholas Kim Coppola, que mudou o sobrenome para Cage, do personagem Luke Cage dos quadrinhos da Marvel, para não ficar sob a sombra do tio, o grande diretor da trilogia O Poderoso Chefão, Francis Ford Coppola foi um dos grandes nomes do cinema estadunidense principalmente nas décadas de 1980 e 1990.

O ator teve ótimas atuações e papéis memoráveis em filmes de gêneros distintos. Desde ação e suspense como A Rocha(1996) e Con-Air - A rota de fuga (1997), passando pela comédia com toques de drama em Arizona Nunca Mais(1987), indo até o drama fantasioso Cidade dos Anjos(1998) com outra "piada acidental" digamos assim, Meg Ryan. 

Mas depois de 2005, precisamente após seu último trabalho altamente elogiado, O Senhor das Armas, o astro começou a dar sinais de problemas, tanto na vida pessoal, com dívidas se acumulando, quanto na profissional, com a quase todo filme se mantendo no máximo no mediano, quando não era francamente ruim. Suas performances também contribuíram muito para que a persona desregulada que se tornara Cage ficasse mais popular que seus bons papéis. 

Em 2018, com o longa de vingança sangrenta, Mandy, pareceu que o velho Nicholas voltaria à tona, mas não passou de ensaio. Agora, em 2021, com Pig, mais uma vez vislumbramos a probabilidade de, talvez, ver mais de um talento nato e inspirador.

Me arrisco dizer que o longa e seu diretor, Michael Sarnoski, que também assina o roteiro com Vanessa Block possam ser incompreendidos pelo drama ser tão sólido e real e seu significado filosófico ser tão profundo que soe melancólico e até deprimente. Eu, particularmente, (e posso estar muito enganada), após uma reflexão rápida em algumas cenas, percebi que é justamente o contrário. Me senti mais inspirada e consolada do que triste. Foi quase como o fim de uma sessão de terapia.

A sinopse parece indicar que teremos uma espécie de John Wick suíno. Trocando-se o cachorro de Keanu Reeves pela porquinha de Cage, e em vez de um extermínio por um sequestro animal. Mas se você for assistir com essa expectativa, melhor passar longe, já que o tom da produção é todo contemplativo. Nada aqui é exacerbado, nem drama - que só fica realmente exposto em algumas cenas, detalhes e principalmente, olhares - nem motivações, nem personalidades. As cenas são, em suma, subjetivas. Preste muita atenção se você quiser realmente compreender o cerne do filme, que (na minha opinião) é sobre a vida, a morte, o significado (tanto o real quanto a falsa significância que a sociedade impõe) das coisas, pessoas e relações, enfim, é sobre tanta coisa. Provavelmente, se assistir mais uma vez, verei nuances que não reparei na primeira vez, e, talvez, em uma terceira assistida, posso captar mais alguma coisa que não notei nas outras. 

                                                            


A fotografia em tons frios, mostrando de cara a crueza do cenário e situação inicial, foi outro acerto. As cores mudam muito de leve, com pouquíssimos contrastes, e nas cenas em que o drama fica mais palpável, o enquadramento vai se aproximando dos personagens muito lentamente, enquanto eles discorrem precisamente sobre o que lhes causa agonia. 

As atuações estão formidáveis, tanto dos protagonistas (considero Alex Wolff, do bom terror Hereditário como um co-protagonista) quanto dos coadjuvantes e até dos que podem ser considerados figurantes, como a confeiteira a quem Robin procura. 

                                                         


Se estivesse em mãos menos hábeis, o roteiro, por melhor escrito que fosse, resvalaria facilmente para um melodrama manipulativo, compulsivo e, portanto, inútil. 
Quantas vezes vimos estórias que sim, fazem chorar, mas que somente fazem chorar? É que na verdade, não é que você tenha ficado comovido, você só foi levado a achar que ficou. Não que não haja choro e ranger de dentes por parte do público nesse caso. Entretanto, como é nítido que a pretensão de Sarnoski aqui é equivalente à sua competência e sensibilidade, a forma como o enredo vai te fazendo entender o que está acontecendo, e o que uma coisa de tal personagem tem a ver com outra do outro, e como tudo se junta e se reflete, como aliás, é na vida, a minha dor espelha a dor do outro e vice-versa, é (entre outros fatores) que faz com que a audiência caia em prantos, e isso, organicamente. Eu, particularmente, não exibi lágrimas, mas não que não tenha sentido o golpe, mas estava preparada para ele e ele me pegou de outras formas. Existem várias maneiras de se emocionar com essa obra, como existem inúmeras visões sobre teorias filosóficas. Embora, eu precise fazer aqui uma advertência: Se você é (ainda que inconscientemente) daquele grupo de (pseudo)cinéfilos que vê um filme com conteúdo, pega sua taça de vinho e se diverte em falar com iguais sobre a obra cinematográfica primorosa que assistiram, tudo naquele ar blasé "superior", então...talvez esse longa não seja pra você, e mais, talvez você se sinta pessoalmente ofendido pela hipocrisia e pose que você carrega com tanto orgulho estar estampada tão descaradamente em todos os personagens, com a exceção de Robin, na brilhante participação de Nicholas Cage.

Um longa emocionante, com um bom ritmo, que passa uma hora e meia de uma estória ao mesmo tempo ágil e contemplativa.  

                                                                                                           Nota: 9.0

 

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