Sweet Tooth: O pós-apocalíptico renovado com sucesso

 



Em 2009, Jeff Lemire criou uma jóia para o selo Vertigo (a parte mais madura e culta da DC) e agora foi lindamente adaptada pela Netflix (e Warner). Que frise-se o adaptada. Pois, sim, toda as mensagens e a atmosfera a um só tempo lúdica e racional da HQ está nesta produção, mas não espere que tudo seja idêntico. Não é. Mudanças (algumas drásticas, na minha concepção) foram feitas. Principalmente a respeito da sanguinolência, que foi bastante reduzida. Muitas coisas foram abrandadas, as experiências a que os híbridos são submetidos, que nem aparecem, por exemplo. A abordagem de tudo é bem mais leve. Por um lado, isso me desagradou um pouco. No entanto, por outro, entendo a necessidade da empresa de streaming precisar fazer com que seu conteúdo alcance um público maior, suavizando a série. 

O ritmo, tanto na HQ quanto na adaptação é, no início, um pouco lento. Depois desembesta em acontecimentos que geram ação após ação, para depois voltar a ir desacelerando, e assim segue por um bom tempo. 

Algumas coisas, me arrisco dizer que prefiro na série.  O arco do doutor Aditya Singh ficou bem mais interessante e em grande parte pela escolha do ator Adeel Akhtar e da atriz que dá vida à sua esposa, Rani, Aliza Vellani, e dá muita curiosidade de saber como irão desenvolver o seu caminho daqui pra frente. 

O contágio da doença que dizima a humanidade, por outro lado, me causou desgosto como foi posta em live action, embora eu tenha plena noção de que faz mais sentido do que nos quadrinhos. 

Se na obra de Lemire os humanos ficariam doentes mais cedo ou mais tarde, não importando o quanto se isolassem e se mantivessem totalmente higienizados, aqui é preciso passar por um local infectado ou ter contato com algum portador da praga. E, sim, é mais realista (mais ainda por todo o momento que vivemos) e gera mais discussão ao abordar como as pessoas lidam com os infectados ao menor sinal de que podem estar doentes (aperte F para Doug). No entanto, na HQ, justamente por ser uma condenação real e irreversível, conforme vão se passando as páginas, vai-se compreendendo que, pra humanidade, não haveria mais saída, não haveria retorno. Era game over. Aceita que dói menos. 

Outro detalhe: a barba que puseram no Abbott era para que ele parecesse mais ameaçador, certo? Então, porque ele me lembra um pouco o Dr. Robotnick? Nos quadrinhos, não tive problemas para odiá-lo e temê-lo, sem necessidade de barba assustadora.

                                  

Lembra ou não lembra?

E também...pra quê mudar de hóquei para futebol americano o esporte que Japperd praticava antes de o mundo acabar, digamos assim? Qual a necessidade? E fazer Gus comer doce em toda oportunidade (ou mencionar o fato do menino adorar um acepipe açucarado) só pelo seu apelido dado pelo Homem Grande ser o título da ficção? Não, nada disso altera coisa nenhuma, mas eu sou daquelas que espera fidelidade em todos os detalhes. Por isso, já avisei para não esperarem isso de Sweet Tooth logo no início da matéria. Caso tenha alguém lendo ou que tenha lido a versão original e ainda não tenha visto a adaptação, não se decepcionar esperando que seja tudo igual. Mas também deixo claro aqui, se ainda não está, que isso não é um motivo para não assistir a serie. Ela tem a sua própria identidade mas é tão preciosa quanto o material de origem. 

Atuações, direção e parte técnica:

Will Forte me é um querido em particular, desde sua participação em How I Met Your Mother e quando dei de cara com ele interpretando o pai de Gus, levei um susto e também fiquei agradecida, pois raramente lhe é dado um papel de destaque. E aqui ele o faz perfeitamente bem. A relação dele com Gus, a forma meiga e firme como ele conduz o menino, ficou maravilhosa.

Falando em Gus, Christian Covery na pele do protagonista, está perfeito. Ele passa tudo com tanta naturalidade que parece fácil. Mas se tem algo parecido com rapadura, é fazer Sweet Tooth. Pode ser doce, mas não é mole não. 

Sim, foi uma piada de tiazona, e me desculpo por isso.

Stefania LaVie Owen é outro nome que vale a pena destacar. O trio formado por sua personagem, a Ursa, o Homem-Grande (Nonso Anozie, muito competente no papel) e Gus, ficou tão homogêneo e flui tão bem, que só dá vontade de cuidar deles e esperar que tudo acabe bem pra todos no final.

Em suma: Todos os atores estão muito bem, obrigada. Não há nenhum grande nome entre eles, exceto James Brolin na narração, e talvez isso seja uma boa coisa.

Aliás, me deixe refazer a frase: não há nenhum nome badalado no elenco. Mas todos tem suas carreiras bem bonitas lá fora...da série. Ninguém caiu de paraquedas. E, muito menos quebrou a cara na queda. Não vi uma só fala fora do tom. 

Os diretores Jim Mickle, Toa Fraser e Robyn Grace tem pleno conhecimento do que estavam fazendo. Sem grandes arroubos criativos ou invencionices desnecessárias, mas ainda assim com marcas próprias, entregam um resultado digno.

Na seção mais voltada para técnica, principalmente na fotografia e cenografia, está tudo nos conformes também. As cores e locações saltam aos olhos nos momentos certos. 

Pra finalizar, ouso dizer que Sweet Tooth pode vir a ser a série preferida (e também a série conforto) de muita gente. E gente de todas as idades. Potencial pra isso ela tem. 

 Ah! Sim, um detalhe: um dos produtores executivos é Robert Downey Jr. 

Isso quer dizer algo? Não.                                                                                                                                                                                                                                                          Nota: 8.2


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