Cruella: Prato cheio pra amantes da moda, e uma boa diversão para o público em geral

 




Até agora, o único live action que eu gostei, e mesmo assim, poderia ter sido bem melhor, foi Cinderella. 

Cruella tirou a princesa do pódio a tapas, unhadas e puxões de cabelo. 

A obra conta como Estella, uma menina que nasceu com, além de com uma característica capilar única e instinto para a moda, um verdadeiro dom de não se encaixar nas expectativas e normas da sociedade. A época e o lugar em que toda essa alma transgressora aflora não poderia ser melhor: Londres, anos 60 para 70. 

Após perder a mãe de forma trágica ela conhece Jasper (Joel Fry) e Horace (Paul Walter Hauser), que vivem de pequenos furtos e golpes. Assim, eles se tornam uma família. Mas Estella quer e precisa ser mais do que isso. Tudo ruma para que, finalmente, ela tenha uma chance ao conhecer a ídola suprema do mundo fashion da época: The Baroness Von Hellman. Uma criatura que é a maldade, o narcisismo e a elegância em forma de mulher. O embate das duas e o crescente desenvolvimento do talento nato de Estella são intrínsecos, e aos poucos quando, reviravolta após reviravolta, as verdades sobre cada uma vão aparecendo, mais Estella vai se tornando Cruella.   

Não é sempre que a junção de um bons roteiristas (cinco ao todo), entre eles Dana Fox (Home Before Dark, New Girl) e Tony McNamara (A Favorita), um diretor talentoso, aqui Craig Gisllepie (Eu, Tonya e O Braço de Um Milhão de Dólares) e um elenco muito afiado, com destaque para as atrizes fenomenais, Emma Stone (Lalaland) e Emma Thompson (Razão e Sensibilidade) dão uma boa liga, mas em Cruella dá sim, não boa, mas ótima. Aliás, espetacular seria o termo mais apropriado. 

Sim, porque tudo no filme é um espetáculo. Nos trailers, isso me preocupou um pouco. Fiquei temerosa que o tom excessivamente teatral ficasse over, quase descambando pro ridículo. Mas, felizmente foi só para causar impressão e, assim, chamar a atenção da audiência. O deslumbre acontece nas horas apropriadas e de forma coerente, é bem ambientado, e sobretudo, belo. 

Beleza e sofisticação, é tudo que se pode dizer para resumir o visual do filme. Sim, porque mesmo quando a energia das cenas é trágica, rebelde ou depressiva, tanto na fotografia quanto em figurino e maquiagem, sabe-se dosar e usar tais cores para passar o que se deseja mas sem cair no mau-gosto ou megalomania. Isso, seria muito, muito fácil de acontecer em mãos menos competentes e cuidadosas. 

A atuação está um primor. Tanto da protagonista que mais uma vez, justifica com louvor seu Oscar, quanto da antagonista que para uma parte do público ficará surpresa ao ver Emma Thompson tão à vontade, principalmente uma parte mais jovem, habituada a vê-la em papéis, ou sem tanto destaque, ou totalmente diferente dessa mulher exuberante que exala classe. Importante ressaltar que todos os coadjuvantes estão maravilhosos, também. Inclusive os caninos.  

A trilha sonora (de Nicholas Britell) é tão perfeita que é quase como um personagem a mais. Não só é acertada a escolha das músicas em si, mas a forma como cada uma é introduzida, acompanhando o desenvolvimento das cenas, sem jamais as sobrepujar, como um som invasivo e inconveniente. Assim como as locações, design de produção, figurino, maquiagem e fotografia, ela conversa com o público, contando a história, mostrando-a ao invés de falar. Desnecessário dizer que, no ano que vem, o longa concorrerá fortemente a prêmios em todas essas categorias.

Com algumas exceções, principalmente no final, tudo faz sentido e é muito bem amarrado. Fica não só crível, como (para algumas pessoas) imprevisível. Mais um acerto do filme é esse, quase não tentar abusar da suspenção da descrença. 

E, pra finalizar, um ponto que considero importante: a fidelidade ao original. Ao contrário do que vi por aí, na minha opinião, não foi como se o longa descartasse tudo até aqui e resolvesse recriar a Cruella. 

Ele apenas a enriqueceu. Adicionou certas coisas, e mostrou outro ângulo de visão, de outras. Mas, ao contrário de Joker e O Diabo Veste Prada (lógico que eu vi as comparações por aí, afinal, eu faço meu trabalho, gente), não abre brechas para legitimar a psicopatia com ideologia ou joga a culpa de seu infortúnio na sociedade. 

Isso fica claro nas conversas, e, depois, discussões de Estella/Cruella, com Jasper. 

Claramente, o amigo é o expectador, que entende e apoia as atitudes e reações da moça, até onde elas se justificam. Depois de um certo ponto, ele não pode e não vai mais simplesmente dizer "mas ela sofre, coitada, então, tudo bem". Não, não é assim. 

Ironicamente, durante essas cenas, me lembrei de uma frase do texto O Menestrel de William Shakespeare: "Quando você está com raiva, tem direito a estar com raiva mas isso não te dá o direito de ser cruel". Sim, também me surpreendi e ri da ironia.

 Se você procura uma boa estória, com um belo visual e uma trilha sonora incrível, te indico Cruella sem pestanejar. Se por acaso, você for um admirador de moda, vai se deleitar. 


                                                                                                                              Nota: 8,8 


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